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Será o fim do suporte?

Pode parecer irônico escrever sobre o fim da área de suporte para uma revista chamada, em tradução livre, “Mundo Suporte”. Talvez seja mais uma ironia dos fatos. Para explicar onde quero chegar, peço a liberdade de usar o início da minha carreira como pano de fundo para ilustrar a transformação pela qual passamos hoje.

Fazendo uso da velha máxima de que sapo na água em aquecimento morre queimado sem perceber a mudança de temperatura, quero ajudar a evitar que sejamos sapos fervidos pelas mudanças.


A acessão do suporte nas empresas
Na década de 90, comecei a trabalhar com tecnologia. Era uma época em que os primeiros PCs estavam sendo instalados em grande escala, substituindo os terminais de mainframe. A profecia de Bill Gates aos poucos começava a se tornar realidade e íamos rapidamente em direção a um mundo onde cada pessoa teria seu computador pessoal, e meu papel estava ligado a isso: substituir os terminais por computadores de mesa, configurando as novas funcionalidades que o acompanhavam. Em linhas gerais, eu era um cara do suporte.
Eventualmente, eu abria aquelas máquinas. Abria, trocava peças, fechava e, para a surpresa de quem acompanhava (e, às vezes, para a minha própria), ela ligava! Meus pais tinham a convicção de ter em casa um gênio do computador. E, às vezes, no auge da minha ingenuidade profissional, era assim que eu me sentia! Sentia‐me profissionalmente admirado pelo espanto dos colegas de outras áreas com o domínio que eu tinha dos recém‐chegados computadores de mesa. Mas o aumento da complexidade desse suporte e a popularização acelerada dos computadores marcariam um rápido declínio dessa carreira.


O rápido declínio da carreira de suporte
Com o tempo, novos sistemas surgiam, novos sistemas operacionais eram lançados e mais pessoas utilizavam computadores. O time de suporte crescia em progressão geométrica. Era preciso organizar os atendimentos. O ITIL, recém‐reconhecido como um padrão, ajudava como um guia de boas práticas de suporte. Categorias, filas, SLAs e outros recursos foram empregados. O computador já havia deixado de ser exclusividade das empresas e, praticamente, todos que possuíam um computador na empresa, tinham um em casa também.
A área de suporte então agrega uma nova função: evitar que os padrões de uso doméstico sejam aplicados aos computadores da empresa (leia‐se instalação de Winamp, Kazaa e acessos picantes de internet). A TI então entra na era do bloqueio pelo bloqueio. Da justificativa de defender os usuários (odeio este termo, mas o utilizo como recurso didático) deles mesmos.
Com o passar dos anos, novos cargos na TI surgem e o suporte passa a ser uma porta de entrada para estes. Os antes gênios do computador já atendem pela alcunha de micreiros. O uso demasiado de processos torna a área de suporte análoga a serviços de call center. Comentários pejorativos associam ligar para o Service Desk com ligar para um 0800. Para otimizar custos, empresas de outsourcing montam estruturas compartilhadas para atender a diversas empresas. Nessa época, eu já trabalhava como coordenador de uma empresa de serviços e era mais um entre tantos gerando SLAs inúteis, Books de Serviços que ninguém lia e cobrando a participação de pessoas em reunião de problemas e de mudanças.


O fim de uma era também pode ser visto como o início da próxima
A popularização dos computadores faz seus usuários perceberem que não é tão complexo instalar uma impressora, instalar um novo plugin e até mesmo um software completo. Começa então o desprezo de alguns pela TI. Ou melhor, pelos bloqueios da TI. A TI alega, com razão, que os bloqueios são necessários para evitar a instalação de software pirata. Mas isso obriga pessoas a ligar pedindo suporte apenas por não terem acesso, tornando comum a frase “abri um chamado, pois não tenho acesso para fazer”. No muito, a área de suporte ainda é vital para suporte aos sistemas defasados cliente/servidor ou para suportar ferramentas implementadas pela própria TI como VPN e desktops virtuais. Processos como Gestão de Mudanças viram alvo de críticas duras de desenvolvedores já familiarizados com métodos ágeis, em um antagonismo que faz a maioria não concordar com eles sem conseguir tirar‐lhes a sua razão.
E eis que surge um novo paradigma computacional: os aplicativos. Minha mãe nem liga o computador em casa com medo que estrague, mas estes dias estava ela me mostrando novos aplicativos em seu celular (e não ligou para a Apple ou para o Google para pedir ajuda!!!). Perguntei‐me: "Como isso é possível???". E, então, percebi que a resposta estava na analogia do sapo na água fervendo.

 

Tudo mudou!
Nos próximos anos, os sistemas operacionais e os aplicativos evoluirão para simplicidade daqueles que temos em dispositivos móveis. Não haverá mais sistema cliente/servidor que não seja web. Não haverá mais VPN ou desktop virtual com nuvem. Os "usuários", que antes temiam os computadores, em breve serão todos de uma geração que já nasceu utilizando computadores. Cada vez mais teremos profissionais nas áreas de negócio conhecendo mais de tecnologia que o time de suporte de TI (basta imaginar um profissional de BigData do Marketing). Este é o cenário de mudança. É a realidade posta.


Explore as mudanças!!!
Diante de um novo cenário, o que temos de fazer não é buscar mecanismos ultrapassados para evitá‐lo, mas sim explorar esta mudança e potencializar seus benefícios (tanto para as empresas, quanto para as nossas carreiras). Ia encerrar assim meu texto, pois meu objetivo inicial era apenas provocar a discussão, mas isso seria pouco construtivo para quem veio até aqui lendo. Assim, tento, de alguma forma, contribuir com cinco dicas de como podemos explorar estas mudanças:


1 ‐ Comece a usar autosserviço
Segundo o Gartner, em 2017, 25% das empresas terão uma Enterprise App Store. Corra e entre nesses 25%. Não irei fazer propaganda de solução, então restrinjo‐me a dizer que existem diversas ferramentas no mercado (inclusive sem custo) que provem isso. Os aplicativos cliente/servidor, os plugins de banco, as impressoras do setor e os softwares livres homologados podem estar todos lá. Comece a remover a dependência das pessoas em relação à TI.


2 ‐ Desenvolva seu time de suporte
Como o autosserviço reduzirá demandas do Service Desk, os profissionais desta área poderão assumir novas funções dentro da TI. Poderão dar suporte funcional do ERP aos sistemas web internos. Os gestores terão um papel vital neste processo, dando a esses profissionais novas oportunidades, suporte em níveis avançados e à empresa mais produtividade pelo mesmo custo operacional.


3 ‐ Aproveite que agora os "usuários" conhecem mais a TI
Incentive a sua empresa a criar modelos orçamentários em que as áreas defendam seu orçamento de TI e não o CIO. Crie modelos inovadores de ITaaS (TI como Serviço) e gere um grau de investimento em tecnologia que você não conseguiria aprovar sozinho e que trará benefícios para a organização em que você atua.


4 ‐ Governança com visão de negócio
Em momento algum concordo em acabar com governança de TI. Meu ponto é que ela precisa ser mais útil ao negócio do que para a TI. Simples assim! Para isso, crie indicadores que tenham significado aos negócios. Esqueça indicadores como "tempo de espera". Os negócios querem saber o tempo médio que um colaborador fica parado por um problema de TI versus o custo que representa reduzir este tempo.


5 ‐ Esqueça o discurso de "este texto não se aplica ao meu caso"
Se você trabalha com suporte, ele se aplica, sim! Os gestores devem protagonizar como agentes ativos estas mudanças, e os demais profissionais não precisam esperar pelos gestores. Testem conceitos de autosserviço e liderem a implantação. Sugiram novos indicadores para sua área. Afinal, como diria um colega meu, "às vezes, um processo de mudança é tão simples quanto o nome: ou muda, ou dança".
Referência citada: http://www.gartner.com/newsroom/id/2334015


Sobre o autor
Formado em Administração na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Formado em Sistemas da Informação pela Universidade Luterana do Brasil. Certificado PMP pelo PMI, integrante e voluntário do PMI‐RS, certificado CSM pela Scrum Alliance, certificado ITIL pela EXIN. Possui mais de 15 anos de experiência na área de TI. Atualmente, é gerente de TI do Grupo RBS, responsável pelas áreas de Serviços, de Projetos e de Análise de Negócio.

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